Bolsonaro e o desmatamento avançam sobre a Amazônia | Land Portal

Por Carol Pires


Possível de garimpo em terras indígenas abre porta para ataques à população local e ao aumento do desmatamento 


No ano em que protestos contra a crise climática rodaram o mundo, da Suécia ao Afeganistão – tanto que a expressão "greve climática" foi nomeada pelo Collins English Dictionary a palavra de 2019 —, o governo brasileiro escolheu dar marcha a ré na política ambiental brasileira. Já não bastassem as tragédias ambientais que se acumulam, do derramamento de óleo no litoral do Nordeste aos incêndios na Amazônia e no Pantanal, o desmatamento e o presidente Jair Bolsonaro avançam contra nossos biomas.


Nesta semana, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirmou ao jornal O Globo que Bolsonaro cumprirá uma de suas mais absurdas promessas de campanha: dentro de 15 dias, enviará ao Congresso um projeto de lei para permitir o garimpo em terras indígenas. Ao desprotegê-las, o governo pode abrir a porteira não só para o ataque aos índios que resistam, mas também para o desmatamento na Amazônia. Isso porque os territórios indígenas são muito mais protegidos que o restante da região. Enquanto 20% da floresta brasileira foi desmatada nos últimos 40 anos, apenas 2% das florestas originais das terras indígenas na Amazônia foram destruídas.


Muitos garimpeiros são pobres trabalhadores em busca de um sustento. Com a crise econômica e a falta de vagas nas cidades, eles têm voltado a se aventurar em atividades ilegais em áreas preservadas. Bolsonaro, que herdou do pai o gosto pelo garimpo, se diz ao lado deles. Mas de forma alguma autorizar a atividade em terras indígenas é a solução.


Foto: Gabriel Monteiro / Agência O Globo



Garimpo fluvial ilegal feito no Rio Madeira Foto: Gabriel Monteiro / Agência O Globo


De imediato, o maior problema será a pressão que a tramitação do projeto colocará sobre os índios. Mesmo sendo proibido, os reiterados discursos motivacionais do presidente a favor dos garimpeiros e contra os órgãos de fiscalização ambiental já tinham inflamado os conflitos de terra. O assassino de Paulo Paulino Guajajara, na Terra Indígena Arariboia, Maranhão, fronteira oriental da Amazônia, é um exemplo, ainda que extremo, do que acontece quando o discurso oficial incentiva a exploração de territórios protegidos. Paulino era um líder dos Guardiões da Floresta e foi morto em uma emboscada por madeireiros ilegais.


Os índios que querem preservar seu território e continuar vivendo conforme os costumes de seus ancestrais são o elo mais fraco diante da pressão econômica. Eles também precisam de dinheiro para remédios e atendimento de saúde, e não há incongruência em querer um celular para se comunicar, um carro para se locomover, e continuar seguindo suas tradições. Diante disso, não precisam de atividades degradando suas terras, mas sim de incentivos para promover seu desenvolvimento econômico respeitando sua cultura, seus territórios e, por consequência, o meio ambiente.


As más notícias para o Meio Ambiente não pararam por aí. Bolsonaro revogou, nesta semana, um decreto que proibia plantações de cana-de-açúcar na Amazônia e no Pantanal, o que garantia um selo verde ao etanol brasileiro. Em vez de apostar em tecnologia que garanta o aumento da produtividade no terreno ocupado, o governo escolhe a expansão agrícola.


Também deve ser apresentado ao Congresso um projeto de lei que reduziria o tamanho de uma reserva extrativista. Poderá ser a primeira de muitas. Em meados do ano, os jornais já noticiavam que o governo estuda reduzir 60 florestas e reservas para priorizar estradas e portos.


Hoje, o Brasil possui a maior diversidade de espécies no mundo , um quinto da água doce e a maior massa verde da Terra. Poderíamos ser uma potência verde — investir em tecnologia para aumentar a produção sem expandir a fronteira agrícola, apostar na produção de alimentos sem agrotóxico, explorar nosso potencial ecoturístico, investir em energia sustentável. Mas é gritar para ouvidos moucos que proteger o meio ambiente é um ativo econômico valioso. Nosso governo é surdo até mesmo para a palavra do ano.


 


Carol Pires


É jornalista e roteirista. Passou pelas redações do Estadão e da revista piauí e hoje escreve para a seção de opinião do The New York Times en Español. É mestre em estudos latinoamericanos pela Columbia University.


Esta matéria foi originalmente publicada em Época.


 


 


 


 

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