A problemática do investimento na agricultura (Cabo Verde)
O processo de desenvolvimento da Agricultura no nosso País é uma luta de gerações. Um bom Governo deve trabalhar no sentido de dar continuidade ao árduo trabalho levado a cabo pela sociedade cabo-verdiana desde 1975, consistindo no aumento da terra arável, no aumento dos recursos hídricos e no aumento do capital humano.
A pedido da Bancada do PAICV, o Parlamento cabo-verdiano, na sua sessão de Junho, teve a oportunidade de debater um tema fundamental para a vida de todos os cabo-verdianos que é a Problemática da importância do Investimento na Agricultura no nosso País.
As motivações do PAICV em propor um tal debate têm a ver, por um lado, com os pronunciamentos próprio do Governo que não têm sido favoráveis a investimentos no Sector Agrícola, por outro, com a dimensão reduzida dos montantes destinados a investimentos contemplados nos orçamentos de 2016 e 2017, que ademais têm sido parcialmente executados.
A impressão que fica, é de um Governo que não considera Agricultura como um sector importante para o desenvolvimento de Cabo Verde.
Para o PAICV, um eventual desinvestimento na agricultura representaria um grande retrocesso e um grande risco económico, social e ambiental para o nosso País.
Na verdade, se pretendemos um país com menos pobreza, mais inclusão social, mais abastecimento do mercado, mais panela ao lume, mais emprego, mais crescimento, mais felicidade e bem-estar para todos, nenhum Governo que passe pela Várzea pode-se dar ao luxo de fugir da sua responsabilidade de investir no desenvolvimento da Agricultura. E nessa matéria, é exigida ao Governo muita sensibilidade social.
A questão da importância da Agricultura na redução da pobreza, na segurança alimentar, na saúde, no aumento da esperança de vida, no crescimento económico tem sido objecto de orientações claras por parte de organismos internacionais.
Para o Banco Mundial, o crescimento agrícola tem poderes especiais na redução da pobreza em todos os países.
Considera que o crescimento do PIB proveniente da agricultura é pelo menos duas vezes mais eficaz na redução da pobreza do que o crescimento do PIB gerado fora da agricultura.
Para a FAO, o investimento na Agricultura é "uma das estratégias mais eficazes para reduzir a pobreza e a fome", e alerta para o perigo de abandono do sector.
Para a OUA, os Estados Africanos devem aplicar pelo menos 10% dos seus respectivos orçamentos anuais de investimento em agricultura e fixar uma meta anual de aumento de produção agrícola em 6%.
A nível interno:
Para o PAICV, o investimento na agricultura é uma questão de fundo, uma questão de sobrevivência e de manutenção da dignidade da população cabo-verdiana.
Considera que é fundamental que não haja nem estagnação nem diminuição dos índices de investimento por trabalhador na agricultura.
Para o MPD, ao que parece, a agricultura não faz parte da sua visão estratégica de desenvolvimento de Cabo Verde.
A esse respeito, a sociedade cabo-verdiana ficou ainda mais preocupada com o MPD e com o Governo, na sequência do debate.
Os discursos vão todos no sentido de se desprezar todo o trabalho de dinamização feito até agora, parar com os investimentos, desmantelar tudo e para começar de novo e em outros moldes. Uma loucura total!
Na verdade, o Governo não quer entender que o País ao aderir às orientações e objectivos internacionais, fê-lo de forma convicta.
Elaborou o seu próprio Plano Estratégico de Desenvolvimento Agrícola e desenvolveu uma agenda agrícola que permitisse ao país visualizar prioritariamente três dimensões:
1ª Uma Agricultura assente em novos mercados, com base em inovações tecnológicas e institucionais;
2ª A mobilização de recursos e projecção de grandes investimentos com vista a promoção do crescimento agrícola, da redução da pobreza e da sustentabilidade ambiental.
3ª A emergência de uma Agricultura integrada em cadeias de valor que vinculam todos os intervenientes.
Na verdade, estava-se à procura de caminhos que pudessem ajudar a pôr termo a uma situação agrícola e ambiental dramática que se vivia no país, havia já vários anos.
A terra já não produzia mandioca. Tudo era importado do Brasil e a preço proibitivo;
Já não se produzia nem batata e nem abóbora; as grandes extensões de bananeiras tinham desaparecido; milhares de coqueiros tinham sido consumidos pelos fenómenos da seca.
Assim, a tendência era claramente para uma carência total num país que ia morrendo ambientalmente aos poucos.
Em resposta, para além da terra, que foi em grande parte reconstituída porque processo da erosão parecia tornar-se irreversível, apostou-se na valorização de mais dois principais activos: o capital humano (particularmente o do MDR) e os recursos hídricos.
• Incentivou-se a investigação aplicada, o combate ás pragas, o controlo fitossanitário e a introdução de novas variedades mais adaptáveis e resistentes.
A contribuição dos técnicos do INIDA, da DGASP, das Delegações do MDR foram inestimáveis.
• Por outro lado, apostou-se na valorização das bacias hidrográficas, na mobilização das águas superficiais através de barragens, reservatórios e diques de captação, na mobilização da água subterrânea e no tratamento de águas residuais para irrigação.
Como resultado, os nossos mercados estão altamente bem abastecidos, as nossas cozinhas transformaram-se em espaço de prazer e laser; as nossas mesas coloridas e bem guarnecidas, espelhando a felicidade e a segurança que sentimos tanto mais quando temos os nossos filhos por perto.
Sendo assim, o PAICV, enquanto oposição construtiva, preocupada com um desenvolvimento inclusivo e partilhado por todos os cabo-verdianos e em todas as ilhas, sugere, na linha das orientações internacionais, o seguinte: • Que ações sejam desenvolvidas no sentido de haver melhoria e aumento em qualidade e a quantidade dos investimentos públicos no sector agrícola, incluindo a pecuária; • Que se Trabalhe no sentido de haver um melhor funcionamento dos mercados, acordando uma atenção especial às questões ligadas aos transportes, às acessibilidade e à cadeia de conservação e transformação. • Que a questão de acesso aos serviços financeiros e redução à exposição a riscos de todos os que operam no sector agrícola mereçam uma atenção especial por parte do Governo. • Que a problemática ligada à inovação do sector agrícola por intermédio da ciência e tecnologia seja reforçada.
Em fim, que a aposta seja centrada numa agricultura mais sustentável e provedora de serviços ambientais, priorizando mobilização dos recursos.
Mas, é preciso que tenhamos bem presente na memória que os ganhos até agora conseguidos não são irreversíveis. O processo de desenvolvimento da Agricultura no nosso País é uma luta de gerações. Um bom Governo deve trabalhar no sentido de dar continuidade ao árduo trabalho levado a cabo pela sociedade cabo-verdiana desde 1975, consistindo no aumento da terra arável, no aumento dos recursos hídricos e no aumento do capital humano.
Fazendo isso, o nosso País estaria a dar passos largos em matéria da sustentabilidade do estado de bem-estar e felicidade de todas as mulheres e homens na nossa Terra.
PS: * Ex-ministro da Agricultura e Economia Marítima e deputado da Nação (AN-25/06/17)
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