Foto: ILRI/Mann/Flickr (CC BY-NC-ND 2.0)
Por Ja! Justiça Ambiental
A JA! acredita que a agroecologia é uma das soluções mais viáveis para a Crise Climática e as demais crises associadas, particulamente em Moçambique um país em que a grande maioria da população vive da agricultura camponesa e tem a terra como o seu principal recurso. Esta posição é fundamentada por inúmeros estudos e exemplos um pouco por todo o mundo, é sabido que a agricultura industrial tem falhado sistematicamente ao não assegurar a soberania alimentar, ao não providenciar a qualidade, diversidade e quantidade de alimentos necessários para nutrir o povo, ao não providenciar empregos dignos, ao usurpar largas extensões de terra de comunidades rurais destas dependentes. Apesar de tudo isto, as iniciativas e o apoio disponível para de facto expandir a prática da agroecologia no nosso país são ainda pouco expressivos, e o Governo aposta e insiste na produção industrial, favorecendo sempre os grandes investidores, o uso de sementes melhoradas e agora até já se fala em sementes geneticamente modificadas e portanto as grandes corporações que controlam todo o mercado, mantendo assim as camponesas e camponeses deste país num ciclo eterno de pobreza e dependência.
A JA! e tantas outras organizações e movimentos sociais insistem em promover a agroecologia e os principios agroecologicos e de modo a expandir a prática tem vindo a promover sessões de capacitação em agroecologia, sistemas agroflorestais e como ponto fundamental nesta prática insistimos ainda na importância da conservação, uso e multiplicação de sementes locais de modo a que os camponeses e camponesas deste país possam continuar a produzir alimentos diversos com qualidade sem ter que depender da compra de sementes “tratadas e melhoradas” que também são dependentes dos seus respectivos pacotes de insumos.
Este ano, durante o mês de Julho, a JA! organizou mais uma série de sessões de capacitação em sistemas agroflorestais, na Comunidade de Nvava, distrito de Lugela, na Comunidade de Namucarrau em parceira com a Missão Tabita, no distrito de Mulevala, ambas na província da Zambézia e ainda na Comunidade de Chamimba no distrito de Cahora Bassa, na Província de Tete. Estas sessões de formação incluem partilha de conhecimentos sobre os princípios agroeocológicos, técnicas de conservação dos solos, necessidade de poda e momentos adequados, reaporveitamento de todo o material vegetal e o estabelecimento de uma machamba comunitária de demonstração que fica ao cuidado destas comunidades. Com o estabelecimento desta machamba de demonstração pretende-se para além do momento de formação, promover organização comunitária nos cuidados da mesma, pretende-se ainda que seja utilizada como exemplo de futuras machambas individuais ou colectivas e é também fonte de sementes das várias árvores frutíferas nestas plantadas.
Até ao momento, a JA! já estabeleceu 4 machambas de demonstração no distrito de Lugela, sendo 1 em cada comunidade com as quais trabalhamos em redor do Monte Mabu, 1 na comunidade de Namucarrau na Provincia da Zambézia, e 2 na Província de Tete, sendo que nesta província as comunidades por sua própria vontade solicitaram apoio da JA! e estabeleceram mais 2 machambas com base nos ensinamentos partilhados. Este trabalho tem sido desenvolvido à vários anos, com inúmeros desafios, desde o acesso a mudas e sementes locais, até ao envolvimento e interesse de algumas comunidades. Não pretendemos de forma alguma romantizar o trabalho, pois como já é sabido promover a mudança de hábitos e de técnicas não é tarefa fácil e encontra sempre alguma resistência, particularmente quando o que pretendemos é desde já eliminar práticas nocivas aos solos, promover diversidade e assim assegurar uma produção diversa e sustentável e ao mesmo tempo promover e resgatar o “sentido” de trabalhar em comunidade, de trabalho conjunto e de interajuda, isto implica abandonar as queimadas, re-utilizar o material vegetal retirado na limpeza das machambas, associar-se para trabalhar e requer muito trabalho e empenho. O impacto e os resultados que temos verificado nas diferentes comunidades são também diferenciados, em determinadas comunidades o interesse e vontade de aprender é enorme, solicitam vezes sem conta mais e mais sessões, mantém-se em constante comunicação, mostram iniciativa e organizam-se e juntos promovem mais e mais machambas, estão empenhados em melhorar o trabalho feito, noutras comunidades vemos uma certa apatia da maioria, pois supostamente estão a trabalhar e não recebem valores por esse trabalho, e o interesse em aprender é de um grupo mais restrito, isto também faz parte da nossa aprendizagem e continuaremos a melhorar também a nossa forma de intervir, pois este trabalho mostra-se cada vez mais urgente e fundamental, dada a contínua expansão de megaprojectos que requerem largas extensões de terra e que usurpam terra produtiva do campesinato, ao contínuo desmatamento e à consequente culpabilização do campesinato pelo mesmo, numa análise muito restrita que busca apenas culpados e não as causas ou possíveis soluções.
Em algumas comunidades, as sessões começam com queixas do que falta, chegamos inclusive a ouvir que “não podemos trabalhar sem galochas, pois magoa os pés” apesar de ao longo de mais de 20 anos de trabalho nunca termos visto um camponês na sua machamba com galochas… noutras comunidades somos recebidos com alegria e entusiasmo, basta a nossa presença, a partilha de conhecimentos e as mudas e sementes que trazemos. Em 2017, dificilmente teriamos limão, laranja ou tangerinas nas 4 comunidades em redor do Monte Mabu, hoje já encontramos facilmente… em 2017 também não conseguiamos comprar couve ou tomate nestas mesmas comunidades, hoje já encontramos facilmente! Esta realidade é sem dúvida a inspiração para continuarmos a insistir e a trabalhar! Os desafios são inúmeros, mas a nossa vontade e necessidade é maior ainda.
Continuamos unidos! Força às Comunidades empenhadas e aos nossos parceiros da Missão Tabita!
A Luta continua!